Por Verônica Falco – CRTR-SP – 5ª Região

Cada vez mais concorrida, a área de radiologia tem avançado na mesma velocidade que a tecnologia. Um perfil profissional que reúne especialização técnica e pessoal pode ser a chave para abrir esse mercado 

A recente, e duradoura crise econômica afetou diversas áreas e causou uma onda de desemprego no Brasil. No segmento da radiologia não foi diferente. A questão enfrentada por profissionais como auxiliares, técnicos e tecnólogos da radiologia é: como entrar e se manter no, cada vez mais exigente, mercado de trabalho.

O perfil profissional é o que tem diferenciado os candidatos no processo de recolocação e estabilidade. A especialização tem sido a palavra que mais se fala, e aparentemente pouco se entende, no segmento.


Para Erik da Silva Lima, gerente do setor de Radiologia do Instituto do Câncer do Estado de São Paulo (Icesp) da Fundação Faculdade de Medicina da USP, as mudanças tecnológicas da área exigem constante qualificação profissional. “A nossa função [dos profissionais de radiologia] deixou de ser uma mera ‘ação operacional’ para se tornar uma assistência de diagnósticos”, afirma Erik, que comanda mais de 160 profissionais entre técnicos e tecnólogos – isso somente no Icesp.

Outro ponto que precisa ser observado pelos profissionais de radiologia, segundo Lucivaldo Santos, entusiasta da radiologia, diretor geral e fundador do Instituto Cimas, é o direcionamento na carreira. “É preciso ter foco na área que você vai seguir. A formação base é o ponto inicial. O profissional que quer se destacar, ser ‘escolhido’ pelo mercado, precisa direcionar seu aprendizado, seus conhecimentos e dominar a área de atuação que escolheu. Saber um pouquinho de tudo, não te capacita para nada no fim das contas”, avalia.

Para ele, isso é tão importante que, no Cimas, os profissionais têm à disposição, gratuitamente, o chamado Programa de Orientação de Carreira (POC). Essa ferramenta de educação proporciona o conhecimento das diversas áreas de atuação da radiologia e, assim facilita a escolha da especialidade que mais agrada ao profissional. “A pessoa tem que ter paixão, encarar a profissão como uma carreira. Com isso a especialização se torna o caminho mais óbvio para que se conquiste sucesso”, afirma.

Quem partilha da mesma visão é Erik Lima que, em 18 anos de experiência em Radiologia atuou em diversas instituições públicas e privadas de São Paulo, afirma ser comum o despreparo. “O número de profissionais que não sabe o que quer, não tem metas, que não olha para a radiologia e diz: ‘meu sonho é trabalhar com isso,’ é tão grande quanto os que não encaram a radiologia como uma missão na vida”, avalia.

 

Surge o conceito “especialização global”

“O perfil profissional abrange condutas que vão desde a pontualidade, humanização do trabalho desenvolvido, domínio da modalidade escolhida, até a clareza de que você é a representação da radiologia perante o paciente”. Essa descrição, feita por Erik Lima, do Icesp, é o resumo do que tem se chamado de especialização global.

Julio Soares, coordenador da equipe de técnicos e tecnólogos em Radiologia Médica da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), garante que não há como fugir dessa realidade e alerta que não adianta ter o melhor currículo técnico se isso não vem acompanhado de dedicação, esmero, seriedade e cuidado no trato diário com os pacientes e com o local de trabalho.

Ele lembra que isso se aplica também aos recém-formados. “Na fase de estágio, essas observações garantem, sem dúvida, um excelente início profissional. Quando a pessoa é boa no que faz, revela cuidado, atenção, zelo e dedicação, fatalmente se destacará entre os demais”, declara o coordenador de Radiologia da Unifesp.

Ana Aparecida Barros, que ingressou na radiologia quando ainda trabalhava como diarista e cuidava de duas crianças – e hoje tem formação como técnica e tecnóloga em radiologia, e é pós-graduada em imaginologia –, se vale da experiência para afirmar que as pessoas devem se dar conta de que ninguém consegue trabalhar sozinho. “Precisamos cuidar para que o ambiente seja favorável, e isso cabe a cada um de nós. Com isso conseguimos diminuir a tensão, que muita vezes é natural, tanto com o paciente, como com os médicos. Isso indiscutivelmente reflete no resultado final do trabalho”, afirma ela, que mora no Aricanduva, zona leste da capital paulista.

Ela não titubeia em afirmar que é preciso amar a profissão que escolheu. “Na área da saúde é preciso gostar de gente. Quem escolheu essa área de radiologia pensando que vai trabalhar menos e ganhar equivalentemente bem, tem que saber: é mito. Você só tem menos horas para desenvolver um trabalho melhor, com mais rendimento e excelência. É o que esperam de você”, avalia.

A estabilidade que pode gerar acomodação

Quem acha que esse profissional de radiologia é utópico, deve se atentar às diversas opções que se abrem, não só na área médica. Cada vez mais o conhecimento se faz necessário, seja na radiologia veterinária, odontológica, nuclear, industrial ou alimentícia, como na gestão, pesquisa e formação de docentes – todos são campos de atuação para quem detém cada vez mais conhecimento.

A tecnologia não regride. A partir do surgimento da telemedicina e os avanços tecnológicos dos equipamentos de radiologia, os médicos estão cada vez mais distantes dos serviços e estão confiando cada vez mais em suas equipes multidisciplinares. Com esse cenário, a evolução do profissional como um todo – a especialização global – é imprescindível para se conquistar espaço. “Precisamos cada vez mais, nos preparar para assistir, servir o médico com imagens, e para que isso seja feito com excelência, esses pontos precisam ser atendidos. Sem isso, não há como se manter no mercado de trabalho”, garante Julio Soares, da Unifesp.

Erik Lima é categórico ao destacar características essências para quem pretende se firmar no setor. Além desses pontos, o gerente de radiologia do Icesp, destaca que os hospitais e clínicas investem em alta tecnologia e precisam de profissionais com capacitação completa para operar esses equipamentos. “Esses itens são um patrimônio da empresa, precisam ser manuseados com conhecimento e responsabilidade, inclusive para a segurança dos pacientes. O profissional que também se atenta a isso é, sem dúvida, muito valorizado”, completa.

Para quem está empregado, o comodismo pode ser o maior inimigo. A dinâmica dos avanços da tecnologia, mudanças e surgimentos de novas especialidades faz obrigatório o que se convencionou chamar de educação continuada. Erik fala que a acomodação profissional é uma armadilha perigosa. “Mesmo escolhendo uma área específica e atuando nela, é preciso ficar atento aos desdobramentos desse segmento, seja em tecnologia, em estudos, ou em novos métodos de diagnósticos”, afirma.

Erik lembra que, com o envelhecimento da população, áreas da medicina, como a ortopedia, a cardiovascular e a oncologia, devem ser positivamente impactadas com a necessidade de diagnósticos por imagem. “Vale ficar atento aos novos procedimentos da medicina geriátrica e sua aplicação cada vez mais importante”, recomenda.

Mas e quem ainda não conseguiu se colocar no mercado de trabalho? A ‘fórmula’ é a mesma, e fora desse contexto as dificuldades só aumentam e o despreparo cobra seu preço. Lucivaldo Santos, que por meio do Cimas trabalha também com processos seletivos, entre eles os do Hospital Santa Joana e da Fundação Instituto de Pesquisa e Estudo de Diagnóstico por Imagem (Fidi), tem um emblemático parâmetro quando se fala da necessidade de qualificação e especialização.


“Tivemos um processo seletivo para 100 vagas e 13% dos candidatos conseguiram ficar acima da nota média. Menos da metade passou na primeira fase”, revela ele que, ao longo da vida, mesmo passando em diversos concursos públicos, sempre foi exigente com o próprio desempenho. “Uma vez, mesmo me classificando, fiquei em vigésimo lugar, e sabe o que pensei? Pensei: nossa, sou muito ruim, preciso estudar mais!’”, ri ao lembrar das vezes que antecederam as primeiras classificações em diversos concursos.

Sem dúvida a falta de experiência tem dificultado as possibilidades de quem está querendo entrar na área. Julio Bandeira Silva, 30 anos, tem formação técnica em radiologia e duas especializações, tomografia e radioterapia, e está prestes a começar um estágio. Ele aposta na troca de experiência e vê na educação continuada um bom caminho a seguir. “Isso ajuda a entrar no mercado com uma carga de conhecimentos atualizada, o que é um benefício tanto para mim como para a empresa que pode também renovar as rotinas”, defende.

A questão da concorrência

Essa atenção e dedicação à carreira pode se tornar a principal aliada frente à situação onde profissionais de outras áreas têm disputado espaço no ramo de atuação de técnicos e tecnólogos.

Na avaliação de Julio Soares, que há 15 anos atua como tecnólogo em radiologia, a falta de competitividade ocasionada pelas atuais circunstâncias normativas da categoria tem sido uma brecha para que trabalhadores sem a formação técnica adequada se coloquem como concorrência no mercado de trabalho. “Estamos sim num momento crítico em que mudanças na legislação trabalhista da nossa categoria se fazem necessárias. Mesmo assim, ele ainda defende que a qualificação é uma das melhores armas para que o radiologista, seja ele auxiliar, técnico ou tecnólogo, firme sua posição no mercado”, reflete.

Muitos se queixam da postura das empresas que exigem experiência e negam oportunidade mesmo para quem tem consideráveis horas de estágio. Sara Mateus, 34 anos, tem formação como técnica e tecnóloga em radiologia e entende bem disso. “Trabalhei três anos como voluntária para me preparar e para, quando a oportunidade chegasse, eu estivesse pronta”, conta. Com duas especializações – densitometria óssea e mamografia – ela, que atua como técnica em radiologia, enfrentou inúmeros desafios tanto na formação como no mercado de trabalho.

Sara lembra das dificuldades para conseguir espaço e colocar em prática o que aprendeu. “Eu sou muito curiosa, porém, o obstáculo que sinto é a prática e oportunidade para aqueles que só têm a formação [sem experiência]”. Ela conta que as empresas não investem no profissional, não incentivam e acabam não aproveitando o colaborador como ‘um todo’.

“O que me ajudou foi o estágio e o trabalho voluntário. O que vale é postura, assumir plantão, saber sair de situações problemáticas”, diz, mas lembra que têm os profissionais que realmente não se importam, “só querem concluir a carga e ir para casa”, conta a paulistana. Ela afirma que não critica quem desanimou, mas também ressalta que reclamar não resolve. “Só ficar esperando sabe, isso não adianta. Eu, mesmo tendo curso superior, atuo como técnica e vejo a dificuldade de arrumar estágio. Imagina quem se formou, jogou o diploma na gaveta e esqueceu dele?”.

Já André Luiz Silva, morador de São Vicente, área litorânea de São Paulo, aos 33 anos tem formação técnica e tecnóloga em radiologia, e pós-graduação em Docência no Ensino Superior lembra que no começo da carreira não foi nada fácil. “Durante os estágios do curso técnico tive a oportunidade de passar pelas mais variadas experiências que um aluno poderia ter. Passei por um pronto-socorro, dois hospitais de médio porte e uma clínica ortopédica”. Como não conhecia ninguém da área, ele teve que traçar uma estratégia para ser conhecido durante o estágio: fazer o máximo que pudesse em vários locais e mostrar aos profissionais o seu trabalho. “Além dos profissionais, mantive contato com uma colega de curso, que veio a me dar uma oportunidade e nos tornamos sócios dessa empresa que temos hoje”, afirma.

“As pessoas ainda pensam no tal QI (Quem Indicou) como forma de garantir um lugar no mercado de trabalho. Isso não existe mais. Recebo dezenas de candidatos indicados por profissionais renomados, mas nem sei quem indicou quem. O QI existe para quem é qualificado e ponto”, finaliza Julio.